Não consigo compreender comédias destas

Não Consigo Compreender Comédias Destas: Espectáculo de Alunos Finalistas da Licenciatura em Teatro da ESTC é um trabalho de encerramento de curso. Porém, este espectáculo contém em si um manifesto desenhado e perseguido no seu próprio processo de construção.

Com efeito, Não Consigo Compreender Comédias Destas. . . partiu, desde o primeiro encontro com o encenador e Director do Teatro Nacional D. Maria II, Professor João Mota, de uma constatação sociológica e política (a revolta dos jovens que estudam e não têm, no entanto, promessa de futuro), plasmada num eixo mitológico que da loucura dionisíaca transitou para o sacrifício prometaico e, deste, rompendo o resignado círculo repetitivo, para uma inescapável revolta comandada pelo fogo. Deste eixo consensual, partiram todos os estudantes, actores, designers de cena e produtores, para uma investigação dramatúrgica, a um tempo egocêntrica e generosa, mergulhando nos fundos da memória teatral do Ocidente. Em português e castelhano.

Esta fase do processo de construção do espectáculo final, com base numa investigação individual, foi-se desenrolando, fora e dentro de cena, através de uma metodologia eurística, centrada no modo tentativa-erro. As palavras dos textos dos muitos (mais de 40) autores desejados pelos (16) actores, foram-se articulando, organicamente, tendo resistido Gil Vicente (implícito), Calderón, Edward Albee, Jean Genet, Federico Garcia Lorca, Tennessee Williams, Arnold Wesker, Ray Bradbury, Sófocles, Armando Nascimento Rosa, Peter Weiss, Roger Vitrac, a par com os próprios textos dos alunos.

Assim se viveu este processo teatral, esta escrita teatral, que procurou um território dramatúrgico quase impossível: uma dramaturgia que desse, igualmente, protagonismo individual a todos, 13 mulheres e 3 homens. É que, numa prova final de Actores, não seria possível, pedagogicamente, mostrar o trabalho interpretativo de uns e subvalorizar o trabalho de outros.

O enquadramento técnico e artístico a que João Mota procedeu para criar, física e psicologicamente, a moldura que do individual, responsável, desagua num colectivo criador, identificou problemas, removeu barreiras e permitiu descobertas, às vezes dolorosas.

Curioso é que, neste processo duro e apaixonado, os estudantes mergulharam desejadamente na História do Teatro. O que procuram eles, afinal? Um teatro seu para um tempo e uma História de que se sentem excluídos? Será esse o sentido da sua interrogação?

Eugénia Vasques, Professora Coordenadora
Lisboa, Teatro Nacional, 10 de Julho de 2014