ZUM Trio

8 jul 2006

Músicas No Átrio do TNDM II à meia noite

8 Julho, Sábado: ZUM Trio
Carlos Zíngaro – violino | Miguel Leiria Pereira – contrabaixo | Ulrich Mitzlaff – violoncelo

A simetria das coisas da Natureza foi durante muitos séculos uma prova da existência de Deus e da suprema harmonia do cosmos, e tão simbólica na sua perspectiva de arrumação e perfeccionismo que tanto homens de fé como de ciência fecharam os olhos ao que era assimétrico ou não correspondia a esse modelo organizacional de inspiração divina.

Até nos aposentos do rei se procurou para o entretenimento deste formatos que correspondiam a tal idealizado equilíbrio, mormente no caso da arte acústica. O quarteto de cordas, com o seu fixado alinhamento de timbres, é bem um exemplo disso, dois violinos, uma viola e um violoncelo reproduzindo a música que supostamente existiria nas esferas celestes. Até que, chegados ao século XX, os homens perceberam que o acaso, o acidente e a entropia não se equacionavam propriamente bem com a exacta equivalência das duas asas de uma borboleta, e até que, por falar em borboletas, o esvoaçar de uma no jardim de Belém poderia corresponder a um terramoto em Singapura.

Ainda que baseando a sua identidade na música de câmara, aquela que os monarcas ouviam à beira da cama, o ZUM desloca-se dessa tradição, propondo um trio de violino (Carlos Zíngaro), violoncelo (Ulrich Mitzlaff) e contrabaixo (Miguel Leiria Pereira) em vez do simétrico quarteto, bem como dissonâncias e assonâncias rebeldes à ordem astral e jogos de tonalidades (com inclusão do completo atonalismo ou de politonalidades) que perturbam os velhos conceitos cristãos e realistas de beleza. Fazem-no, para mais, com privilegiação da intuitividade, do gesto espontâneo, da reactividade imediata, do não-determinismo do som pelo intelecto ou pelo superego, em suma, da improvisação.

É esta, aliás, a via de expressão na música precisamente desse Caos que bispos e coroados tanto temiam, o Caos que, afinal, rege todas as coisas que vemos e emana de dentro de nós. Algo que podemos contemplar serenamente, mas que tem equivalência na súbita queda de um avião nos Alpes ou num assassínio cometido em Nova Orleães devido a um pedaço de pão.

Rui Eduardo Paes

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